Eu corri minha primeira meia maratona em 2017. Naquele momento, achei que pararia por ali, que seria apenas um desafio para marcar a minha história. Mas a corrida, com toda sua intensidade e entrega, trouxe tanta alegria para minha vida, que eu continuei. Continuei porque não é apenas sobre correr; é sobre sentir. Sentir a força no corpo, a superação na alma, e a felicidade de cruzar aquela linha.
Hoje, sete anos depois, já completei 18 meias maratonas e, no último domingo, deveria ter completado minha 4ª maratona. Quem me acompanha sabe que gosto de dividir cada treino, cada conquista e cada sonho. Para muitos, correr uma maratona parece um objetivo louco, quase impossível. Só quem já trilhou esse caminho entende o quanto ele é solitário e, ao mesmo tempo, envolvente. Mas não apenas os corredores. Todos que convivem comigo também entendem. Eles sabem como sou: focada, disciplinada, um tanto obcecada. Envolvo quem amo nessa paixão, porque cada prova se torna um momento de celebração — é mais do que apenas eu e a corrida, é sobre todos que torcem comigo.
No domingo, porém, algo inesperado aconteceu. Eu abandonei a prova. Nunca imaginei que essas palavras fariam parte da minha trajetória. Eu sempre fui aquela que acredita que, não importa o quanto doa, você se arrasta até pegar aquela medalha. Mas, no quilômetro 17, meu corpo simplesmente parou. Uma dor aguda tomou conta do meu quadril direito e me deixou estática. Comecei a caminhar, mas a dor era tão intensa que parecia insuportável. A cada passo, uma enxurrada de pensamentos invadia minha mente: “Droga, meu RP já era.” “Vou ter que caminhar… não, vou trotando, não vou desistir.” “Está doendo demais, não vou conseguir nem isso.” “Até onde aguento? Posso continuar? Deveria?” E, finalmente, a pior conclusão de todas: “Eu vou parar…”
Quando essa realização me atingiu, foi como se uma onda gelada percorresse meu corpo. Lágrimas brotaram sem controle enquanto eu buscava um posto médico. A dor física já não era mais o pior. Era a dor de ver os outros corredores passarem por mim, gritando “Vamos! Não desiste!”. Era a dor de cada passo que me afastava do meu sonho. Me arrastei até o posto no quilômetro 18, entre lágrimas e frustração.
Lá, me deram duas opções: uma viagem de ambulância até o hospital para uma injeção de ibuprofeno ou simplesmente voltar para casa. Eu não queria que aquele sofrimento se estendesse ainda mais, então escolhi ir para o apartamento. Me lembrei das histórias de amigos que terminaram suas maratonas em hospitais, presos em burocracias, e decidi que Buenos Aires não me veria de ambulância.
Quase meia hora depois, esperei por um Uber, ainda chorando, ainda dolorida. Tinha que ir até a largada buscar minhas coisas no guarda-volume. Um colega, que também havia abandonado a prova, me ajudava. Eu mal conseguia andar, sentindo dor e lágrimas sem fim. Quando finalmente peguei minhas coisas, desabei. Ver os outros atletas com suas medalhas, sorrindo, vibrando, me deu um nó no peito. Aquelas medalhas brilhavam como uma conquista que me foi arrancada.
Não era apenas dor física. Era como se algo precioso, algo que já era meu, tivesse sido cruelmente tirado. Eu treinei, eu fiz tudo certo. O que deu errado? Não foi fracasso, não foi arrependimento… foi tristeza pura. Uma tristeza tão profunda que parecia castigo. Algo que eu não merecia.
Eu não me lembro da última vez que chorei assim.
Voltei para o apartamento, e a tristeza se transformou em medo real: o que será que era essa dor? Uma fratura? Será que ficarei sem correr? Sem andar? O pânico e o choro se misturavam, mas a vida adulta é dura, e temos que seguir em frente.
Amigos se preocupavam, o médico me tranquilizou. E, com a autorização dele, fui tomar meu vinho — tentando brindar ao futuro que eu ainda não conseguia enxergar. Ainda choro. Ainda me pego revivendo cada momento daquele dia. Mas a realidade nos empurra para a frente. Escrevo estas palavras ainda sem o resultado da ressonância, ainda sem respostas, ainda sem entender por que tudo isso aconteceu.
Eu queria esquecer, mas sei que não posso. Então, prefiro eternizar. Espero que, um dia, eu volte a ler este texto com alívio. Que eu possa, finalmente, entender o porquê de toda essa dor e transformá-la em mais um capítulo de superação na minha história.